sábado, 19 de fevereiro de 2011

50 anos a mil

Essa semana assisti umas duas vezes a entrevista concedida por Lobão à jornalista Elisabete Pacheco do programa Almanaque na GloboNews. A entrevista foi para mim, em parte, um convite à leitura de 50 anos a mil, autobiografia do roqueiro e, noutra parte, um convite a rememoração e a investigação. Rememorações divertidas de um tempo em que seu som embalava minhas baladas nos anos 80. Minhas memórias ficam ainda mais divertidas quando é o próprio Lobão que as avalia. Parece loucura? Mas é sério! Nasci e morei em Brasília quase todo o tempo de minha vida e a cena do rock da capital era nos fundos da minha quadra. Escutávamos de tudo naquela época e tudo que era produzido em Brasília, tinha lugar de destaque em nossas fitas cassetes. Gravações de garagem eram como se fossem ouro prá nós e tínhamos várias, mas curtíamos de tudo, uma mistura doida, algo comum nos anos oitenta. Cores fortes cabelinhos diferentes, tecladinhos irritantes dos quais nem mesmo o velho Lobão escapou. Ninguém esquece a banda, Lobão e os Ronaldos, ou mesmo seu primeiro sucesso Cena de Cinema, com aquela guitarinha lá lá lá e o som meio NEW WAVE que ele mandava, seu tempo com a pop Blitz e de outras parcerias. Algo que agora ele parece não lembrar. Quer se incluir entre os roqueiros que faziam rock de verdade contrapondo-se ao grupo que ele chama, de maneira classificatória, de rock de bermudas, dos Paralamas e da Legião, representando um rock mal feito, ruim. No fundo sempre se soube que nem tudo era assim tão bom, nem tão bem feito e que, no fundo, tinha muita coisa ruim mesmo, malfeita, mal tocada, enlatada e tudo mais. Parece que Lobão quer um lugar especial no meio daquela farofa toda. Fala sério, Lobão! O cara tocou numa banda com o Ritchie e quer escapar da farofa? Na entrevista, sem saber, Lobão acusa minhas memórias, e talvez a memória de outros, de misturar alhos com bugalhos ou ele e o restante do rock brasileiro, mas pelo que fala na entrevista, ele e Cazuza são diferentes no meio desta cena. Quero entender por que ele acha isso? Na entrevista Lobão dispara contra tudo e contra todos fazendo parecer em alguns momentos que detém a chave do cofre de algum conhecimento a que ninguém teve acesso. A jornalista ligou a câmera e o microfone e deixou o cara falar. Grande, barbudo e com o rosto de quem visivelmente viveu 50 anos a mil Lobão está solto e falando de tudo no programa. Entrevistas que devem se repetir algumas vezes já que o livro lançado no final do ano passado começa a repercutir e, embora eu não seja fã do gênero – autobiografia explosiva que revela tudo – confesso que fiquei curioso. Entre as já conhecidas acusações a MPB, os roqueiros de Brasília e as leis brasileiras a metralhadora giratória de Lobão acerta outros tiros. Criticando a heroicidade de Macunaíma e a idéia de que a cultura brasileira seria, como disseram os modernos, resultado antropofágico, ele foi enfático – “Minha música não é resultado de antropofagia! Eu tenho nojo de dizer que sou antropofágico, eu sou educado, eu não como ninguém, eu não preciso digerir a arte seja lá de que parte do mundo for sem querer dar uma de malandro agulha – Ah eu vou comer e parará! Eu não sou nem filho de indígena, eu não tenho nada a ver com isso e quem era um Caeté, como o próprio Ledo Ivo, abomina... ... Antropofágico o cacete! E a gente ainda tece loas a Macunaíma o herói sem nenhum caráter, preguiçoso. Porra cara eu não sou nada disso! Qualé?” Em tempos de um rock nacional frágil como o que vivemos agora um pouco mais desse antigo debate cairia bem prá caramba, aliás qualquer debate cairia bem prá caramba! Vou ler o livro.

Um comentário:

  1. O Lobão sempre foi muito espirituoso. Numa entrevista, lá pelos fins dos '80, em que ressaltava sua paixão por motos, ele disse que "pegava a Téneré e subia pra Vista Chinesa pra fazer defunto-cross". A alusão se dava por conta das incontáveis desovas na subida da Vista.

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